Em menos de 15 dias, Sergipe registrou seis novos recordes de internações por covid-19 em leitos de enfermaria e UTI nas redes pública e privada de saúde. O pico de 764 hospitalizações na primeira onda da contaminação ocorrido no dia 16 de julho de 2020 foi superado seis vezes entre os dias 23 de março e 4 de abril de 2021, quando o número de internados chegou a 834. A gravidade no adoecimento de pessoas nessa segunda onda da pandemia no estado está associada à predominância da circulação da variante P.1.

É o que indicam dados preliminares de uma análise epidemiológica liderada pelo chefe do Laboratório de Patologia Investigativa da Universidade Federal de Sergipe (UFS), professor Paulo Ricardo Martins Filho, com base em dados do Lacen-SE (Laboratório Central de Saúde Pública de Sergipe). O estudo completo sobre o assunto foi enviado para publicação em uma revista científica internacional.

A variante B.1, comumente identificada no país ao longo dos primeiros meses da pandemia, dominou a primeira onda da contaminação no estado. Essa linhagem apareceu na análise genômica de 58% das amostras sequenciadas pelo Lacen-SE junto à Fiocruz entre março e agosto do ano passado. Porém, o cenário começou a mudar a partir da virada do ano.

A P.1, conhecida como variante brasileira, originalmente encontrada em Manaus-AM, foi identificada em mais da metade (55,6%) das amostras sequenciadas entre dezembro do ano passado e fevereiro deste ano em Sergipe. O primeiro caso da nova linhagem do vírus foi registrado no estado no dia 17 de janeiro. Um mecânico de aeronaves que veio do Amazonas.

A análise ainda revela que a variante P.2, descoberta inicialmente no Rio de Janeiro e identificada pela primeira vez em Sergipe no dia 26 de dezembro, predominou em 30,2% das amostras no período analisado no estado. Outras cepas relacionadas à B.1 representam 14,2%.

​​​​Professor Paulo Martins

“Houve uma mudança importante no retrato das linhagens que circulam em Sergipe entre as duas ondas de covid-19. Atualmente, quase 90% das amostras sequenciadas são das linhagens P.1 e P.2. A P.1 já circula amplamente em território nacional e suas mutações têm sido associadas a uma maior capacidade de transmissão e a casos de reinfecção,” afirma Martins.

Hospitalizações na segunda onda

Em Sergipe, o número de pessoas infectadas pelo novo coronavírus que precisaram de hospitalização em leitos de enfermaria e terapia intensiva subiu aproximadamente 160% por sete semanas seguidas de 15 de fevereiro a 3 de abril. Nesse período, o volume de pacientes internados com a doença na capital foi quase cinco vezes maior que o registrado no interior.

O pesquisador pontua que “a segunda onda tem apontado para uma mudança no perfil clínico dos pacientes, havendo um volume muito grande de hospitalizações de adultos entre 20 e 59 anos com quadros mais graves e isso acaba refletindo no aumento do número de mortes”.

Mortes entre pessoas internadas

No primeiro mês do ano, a taxa de óbitos entre pessoas hospitalizadas com a infecção em Aracaju foi de 13.5%. Em seguida, a tendência de alta de mortes entre pacientes internados com a doença na capital elevou o índice de 14,7% em fevereiro para 37,7% em março.

“Nas últimas sete semanas, por exemplo, houve um aumento de 350% na média móvel de óbitos diários por covid-19 em Aracaju. As evidências apontam que a P.1 pode estar associada a casos mais graves da doença, inclusive entre adultos jovens,” ressalta Paulo Martins.

Após a publicação dos decretos governamentais que visam restringir a circulação e aglomeração de pessoas, a taxa de reprodução do vírus (R) caiu para 0.93 em Aracaju. No entanto, segundo Martins, o comportamento da curva epidêmica também se associa às características das mutações.

“A redução na taxa de reprodução indica que o vírus tem encontrado um pouco mais de dificuldade em infectar hospedeiros susceptíveis, mas o volume de hospitalizações ainda é extremamente preocupante, já que as pessoas infectadas com essas novas linhagens tendem a apresentar quadros clínicos mais graves, inclusive entre os mais jovens. Dessa forma, além das medidas restritivas adotadas, é necessária a ampliação da vacinação,” frisa o professor.

Paulo Martins ainda afirma que o comportamento da curva epidêmica sugere que o pico da segunda onda da contaminação em Sergipe ocorreu em março, mas os reflexos disso em termos de hospitalização e óbito serão observados a médio e longo prazo.

“Em decorrência da dinâmica da pandemia e da circulação dessas novas linhagens, não é possível ainda relaxar as medidas já adotadas, além da necessidade de se ampliar a vacinação. A população precisa entender a gravidade da situação e continuar adotando todas as medidas já amplamente conhecidas de controle de disseminação do vírus,” pondera.

Fonte: UFS