Doutoranda aborda em sua pesquisa os desafios e perspectivas na análise de gênero e sexualidade em contextos políticos controversos
As temáticas relacionadas aos direitos da população LGBTQIAP+ têm sido objeto de intensos debates e transformações ao longo dos anos. Em um país marcado por uma diversidade cultural rica, a busca por uma compreensão mais inclusiva e igualitária dos direitos fundamentais é um caminho complexo e desafiador.
Nesse contexto, iniciativas acadêmicas que se propõem a analisar e compreender o papel do sistema jurídico na construção da visibilidade e garantia desses direitos se destacam como importantes agentes de transformação social. A ex-aluna do curso de Direito da Universidade Tiradentes (Unit), Daniela de Andrade Souza, embarcou nessa temática desde sua Iniciação Científica. Seu projeto, que inicialmente analisou a jurisprudência dos Tribunais de Justiça brasileiros entre 2011 e 2018, revelou um panorama detalhado das lutas e conquistas da comunidade LGBTQIAP+ no âmbito jurídico.
Esse ponto de partida não apenas solidificou sua trajetória acadêmica, mas também impulsionou um compromisso contínuo com a promoção da igualdade e visibilidade desses grupos. “O projeto de IC surgiu durante meu mestrado, que teve como tema a análise do discurso das decisões dos tribunais de justiça brasileiros sobre uniões homossexuais e retificação de nome e gênero de pessoas trans no registro civil. A ideia foi identificar as regulações do discurso jurídico sobre as questões de gênero e sexualidade, delimitando quais eram possíveis e, com isso, detentoras de direitos”, explica.
Resultados e frutos da pesquisa
Através de uma abordagem meticulosa, a pesquisa contemplou mais de 600 decisões judiciais nos cinco maiores tribunais do país, buscando compreender as nuances e desafios enfrentados por indivíduos LGBT em suas demandas legais. “Com essas decisões coletadas, foi possível sistematizá-las em um banco de dados que, na escrita da dissertação, foram tratadas sob análise quantitativa com a construção de gráficos, e, a partir disso, chegou-se à etapa qualitativa com a análise do discurso de cerca de 60 decisões”, revela.
A relevância desse estudo não reside apenas na análise quantitativa e qualitativa das decisões, mas também na capacidade de apontar os caminhos que o discurso jurídico percorreu ao delimitar os direitos dessa comunidade ao longo do período estudado. Esse projeto proporcionou a base necessária para sua posterior trajetória acadêmica, incluindo mestrado e doutorado. A continuidade da pesquisa para o doutorado aborda uma mudança de perspectiva, enfatizando o discurso reacionário dos parlamentares no Brasil e na Argentina sobre os direitos de gênero e sexualidade.
“Hoje, minha linha de pesquisa do doutorado segue sendo acerca das questões de gênero e sexualidade, mas a partir de um outro ponto de vista: a do discurso reacionário dos que estão no poder. Vou analisar comparativamente o discurso dos parlamentares do Brasil e da Argentina sobre os direitos de gênero e sexualidade, e como a onda reacionária impacta desde a corrida eleitoral até a proposta e aprovação de projetos de lei que utilizam de normas jurídicas para serem antidireitos de mulheres e LGBTQIAP+”, ressalta.
Trajetória acadêmica
Para Daniela, os projetos de IC desempenham um papel fundamental na formação acadêmica, proporcionando uma imersão na vida científica e acadêmica, especialmente em áreas como Direito. Além de contribuir para o preparo científico, a participação em projetos de IC pontua de forma positiva no currículo, um diferencial importante em seleções para mestrado e doutorado.
“É uma oportunidade de realizar outras leituras, de compreender as metodologias de pesquisa, de ver o curso com outro olhar e oxigenar as práticas jurídicas. Além disso, para quem visa a carreira acadêmica, como meu caso, é fundamental ter esse mergulho na graduação pois, além de contribuir com o preparo científico, pontua no currículo para as seleções de mestrado e doutorado”, elenca.
Ela destaca também sua participação em projetos voluntários durante a graduação, como o que abordou o acolhimento de estudantes trans nas instituições de ensino superior de Direito em Sergipe, projeto premiado como o 2º melhor trabalho de IC na área de humanas e sociais.
“Certamente, todos os conhecimentos científicos que possuo têm a Unit como ponte. Na graduação, tive a oportunidade de realizar um intercâmbio de seis meses em Portugal, por conta do convênio da Unit com o Santander, participei de projetos de IC, eventos, estágio na Defensoria Pública por conta do Projeto Reformatório da instituição, além da formação como bacharel em Direito. Existem muitas oportunidades extracurriculares que ampliam nossa formação acadêmica e profissional. No mestrado, fui bolsista CAPES, tive projeto de IC, participei de eventos, ministrei minicursos e finalizei o curso preparada para o mercado de trabalho, do qual voltei após 2 anos para o doutorado”, relembra.
Projeto Transjus
Além de suas pesquisas, Daniela participou do projeto Transjus, criado por alunos da graduação de Direito que queriam utilizá-lo como instrumento de transformação social e tinha como foco atendimentos jurídicos para pessoas trans em situação de vulnerabilidade econômica e social.
“Formamos um grupo de voluntários que realizava atendimentos no Núcleo de Práticas Jurídicas da Unit (NPJ), para pessoas trans e depois para todas as pessoas dissidentes de gênero e sexualidade, em situação de vulnerabilidade econômica e social. Participamos de mutirões de retificação de nome e gênero no registro civil na Casamor, uma instituição de acolhimento LGBTQIAP+ de Aracaju, bem como realizamos eventos beneficentes voltados a essas instituições. O Transjus teve um grande impacto social, principalmente por ter saído dos muros da universidade, tendo, inclusive, virado um projeto de extensão à época”, finaliza.
Asscom Unit