Depois de uma vida de luta pela educação, Ana Lúcia Vieira Menezes recebeu o título de Doutora Honoris Causa pela Universidade Federal de Sergipe (UFS) na noite desta sexta-feira, 12. Ela é a primeira docente da educação básica a conquistar o feito.
"Se a gente fica assim calado, o errado parece o certo", dizia a canção entoada por Nino Karvan no palco do Auditório Libório Firmo. O músico, que é servidor da UFS, abriu a solenidade.
Os versos de Nino, fruto de parceria com Chico César, representam a história combativa da professora, militante, sindicalista e ex-deputada estadual Ana Lúcia. Formada em Pedagogia pela UFS em 1973 e concursada como professora estadual em 1975, Ana Lúcia veio a se tornar a maior liderança do Sindicato dos Trabalhadores em Educação em Educação Básica de Sergipe (Sintese).
“É grande o desafio de falar de alguém que não apenas é professora de formação, mas que ama sua profissão, e de tanto amar faz dela o próprio nome”, enfatizou Valter Santana, reitor da UFS. “Realmente, é até difícil falar apenas ‘Ana Lúcia’, sem que seja seu primeiro nome – talvez o verdadeiro nome – ‘professora’ utilizado”, complementou.
“Ela se moveu por cinco décadas de vida pública, tendo a trajetória marcada pela luta política, pelo engajamento sindical, pela coerência nos atos, pela opção inegociável pelos mais humildes e necessitados, por uma trajetória impecável como parlamentar e pelo compromisso intenso e perene com o magistério e a educação pública”, proferiu ainda o reitor.
“É possível dizer que hoje a UFS concede o título de Doutor Honoris Causa, por extensão, a todas as professoras da escola pública sergipana que são mães, muitas vezes também alunas em cursos de formação continuada, enfrentando a tripla jornada, e o mundo sempre relutante em reconhecer seu valor”, arrematou Valter.
Militância e vida pública
Ana Lúcia ocupou ainda a Secretaria Municipal de Educação de Aracaju, durante o mandato de seu correligionário Marcelo Déda como prefeito, entre 2001 e 2002, abdicando da função para se candidatar a deputada estadual, vindo a conquistar a cadeira. Reeleita em 2006, chefiou a Secretaria de Estado da Inclusão, Assistência e Desenvolvimento Social, a qual renunciou, entretanto, para apoiar a luta do magistério estadual, que havia declarado greve.
“O título é o reconhecimento de um trabalho que ela vem realizando ao longo dos anos, não só como parlamentar, mas como dirigente sindical, como uma mulher socialista que luta em defesa da população, em defesa dos vulnerabilizados e, sobretudo, em defesa de um novo modelo de sociedade, um novo modelo de mundo, onde as pessoas sejam vistas como iguais”, disse a vereadora Ângela Melo, presente na cerimônia.
Colega de partido de Ana Lúcia e, assim como a homenageada, ex-presidente do Sintese, Ângela lembrou a parceria de militância sindical e política com a amiga. “Uma história de paixão pela luta em defesa da educação, décadas em que nós caminhamos juntas com esse sonho. Nós somos irmãs de sonho, de luta, e nessa caminhada nós vamos construindo, tendo vitórias, tendo derrotas, mas fazendo das derrotas uma lição para a construção de novas vitórias”, exclamou a vereadora.
“A Universidade Federal de Sergipe está de parabéns, e todas nós que militamos com Ana nos sentimos homenageadas, agraciadas por esse título”, finalizou.
A solenidade de entrega do título de Doutora Honoris Causa a Ana Lúcia foi prestigiada por companheiros de militância, admiradores, amigos e familiares – além do esposo, José Santos de Menezes, os filhos Ana Carolina, Mônica e Mário Jorge Sobrinho, e netos participaram da cerimônia.
O Título
A Universidade Federal de Sergipe concede o título de Doutor Honoris Causa como homenagem máxima conferida pelo Conselho Universitário (Consu), a personalidades que se distinguiram, seja pelo saber, seja pela atuação em prol da Filosofia, das Ciências, da Técnica, das Artes e das Letras, seja pelo melhor entendimento entre os povos ou em defesa dos direitos humanos.
Na cerimônia, o Consu foi representado pela conselheira Silvana Bretas, docente do Departamento de Educação. Ela enfatizou as diversas frentes em que atuou a homenageada.
“Seu percurso passa pelo campo da docência, da educação, da política sindical, partidária e da cultura. Sua profissão docente se funde com a história do Sindicato das Trabalhadoras e dos Trabalhadores da Educação de Sergipe”, descreveu Silvana.
“Uma militante de esquerda que não se apartou das lutas da rua junto aos movimentos sociais e sindicais em nenhuma das fases de sua vida. Seja como recém formada em pedagogia na UFS, seja como secretária em órgãos de gestão pública, seja como presidente do Sintese, seja como intelectual comprometida com a educação emancipadora, ou seja como deputada estadual em quatro mandatos”, pontuou.
“O ato de outorga deste título carrega a dimensão vibrante e inequívoca de que professoras e professores são intelectuais com compromisso com a formação dos estudantes e que a escola público é o espaço de socialização, de produção do conhecimento, das artes, da cultura, da subjetivação e objetivação da constituição do ser humano”, professou Silvana.
“O que temos a aprender com a professora da educação básica?”, provocou a conselheira em seu discurso. “Que força é essa que levanta uma categoria de profissionais, cria um sindicato combativo, ganha as ruas, ganha corações e mentes, e não se aparta, em nenhum momento, daquilo que definiu como seu destino que é a luta pela emancipação da classe trabalhadora, por uma educação de base democrática e por uma sociedade justa!”, assinala.
Militância homenageada
A nova Doutora Honoris Causa da UFS, Ana Lúcia Vieira Menezes, recebeu a homenagem como um reconhecimento às lutas do campo popular em favor da educação pública.
“Agradeço à Universidade Federal de Sergipe pela iniciativa de conceder essa homenagem a uma professora que se constituiu na luta, no chão da sala de aula, nas ruas, na Secretaria da Educação, em defesa sempre da escola pública, de uma escola de qualidade social, mas também em defesa da justiça, da igualdade do povo brasileiro, do povo sergipano”, saudou Ana Lúcia.
“Neste ato, que preciso enaltecer, porque sou fruto desse movimento coletivo, essa homenagem escolheu a minha pessoa, mas eu tenho certeza que vocês reconhecem que são os lutadores do povo no campo social, no campo popular, no campo sindical a quem realmente essa homenagem se estende”, assegurou.
“Apesar dos desafios [do atual quadro da educação em Sergipe], há uma força que nos alerta: somos as ‘Marias da educação’ e sabemos que a mão que manuseia o giz, se for preciso, constrói as batalhas na busca da vitória”, conclamou Ana Lúcia Vieira Menezes.
Marcilio Costa - Jornalista/Ascom UFS