De autoria do Governo de Sergipe, Lei ainda incentiva pesquisa científica e projetos de extensão em universidades públicas e privadas, além da capacitação de pessoal para prescrição, atendimento e distribuição na Rede Estadual de Saúde

O psicólogo Sérgio Alex Lima tem um filho de sete anos com paralisia cerebral. Uma intercorrência após seu nascimento chamada de kernicterus, que é um aumento brusco da bilirrubina, provocou convulsão e uma lesão que resultou em um quadro de paralisia cerebral. Desde esse episódio, ele passou a tomar anticonvulsivantes e ainda nos primeiros anos de vida, a família começou a analisar a possibilidade de substituir por um tratamento menos hostil.

“O uso do extrato de Cannabis, que ajudou muito meu filho. Encontramos uma especialista que prescreveu a Cannabis terapêutica e foi uma benção, pois ele não teve nenhum episódio de convulsão nesse período em que utilizou o extrato durante três a quatros anos, sobretudo porque ele parou de usar os remédios que possuíam vários efeitos colaterais. Fazer a troca pelo medicamento mais natural foi muito importante para nós. Fomos ensaiando a redução das gotinhas diárias até completarmos o desmame e meu filho não tem precisado mais”, relatou o psicólogo convicto que o uso da Cannabis Medicinal foi essencial no quadro de melhora do filho.

A Lei que institui a Política Estadual de Cannabis para fins terapêuticos, medicinais, veterinário e científico tem a finalidade de oferecer apoio técnico institucional para pacientes, seus responsáveis e associações de pacientes, bem como incentivo a pesquisa científica e a projetos de extensão em universidades públicas e privadas, além da capacitação de pessoal para prescrição, atendimento e distribuição na Rede Estadual de Saúde dos produtos à base de Cannabis.

O secretário de Estado da Saúde, Walter Pinheiro, celebrou a aprovação da lei, não só pela facilitação do acesso aos medicamentos, mas pela redução da judicialização. “Nós atendemos a vários processos judiciais para compra de medicamentos à base de Cannabis. Sabemos que os pacientes precisam de continuidade no tratamento e a lei é um avanço em diversos aspectos. Estamos falando de cuidado, pesquisa e capacitação profissional. Vamos fazer valer o direito desses pacientes de forma mais ágil e integrada, em diversas áreas do conhecimento”, avaliou.

Pesquisa

A Lei prevê que as instituições de pesquisa podem auxiliar nas atividades relacionadas ao cultivo, colheita, manipulação de sementes, mudas, insumos e derivados da Cannabis. Para o professor do Departamento de Farmácia da Universidade Federal de Sergipe, Lyzandro Borges, a política estadual da Cannabis é uma lei revolucionária em Sergipe, pois sai a frente de outros Estados, mostrando que estamos na vanguarda do respeito e consideração pela ciência.

“São vários estudos nacionais e internacionais que mostram que os derivados da Cannabis como o canabidiol, possuem potencial para tratamento de inúmeras doenças como é o caso das doenças psiquiátricas, epilepsia, espectro autista e a diabetes que é a nossa área de pesquisa. Portanto, essa lei abre caminhos no combate do preconceito, entendendo que uma planta possui vários princípios ativos e que não estamos falando do seu uso recreativo e sim na utilização medicinal para salvar milhares de pacientes. Então, essa lei vem a favor da vida e do combate às doenças que infelizmente os medicamentos que temos hoje não possuem potencial de ação como os derivados da Cannabis. Além da importância da lei fomentar nas instituições como a Universidade Federal de Sergipe, o apoio aos pesquisadores que estudam a planta a fim de desenvolver produtos e salvar vidas”, explicou.

O biólogo Gustavo Faro é presidente do Instituto Marijuana Garden e há 20 anos iniciou o trabalho de pesquisa com a Cannabis e disse que já sofreu pela ausência dessa regulamentação. Inclusive foi preso por pesquisar a planta.

“O governo de Sergipe também está reparando a dor e o sofrimento de diversas famílias. Esta lei coloca luz no assunto e na necessidade de desenvolver um passo a passo para sua implementação’, ressaltou.

O que dizem os médicos

A médica reumatologista Iza Melo prescreve medicamentos à base de Cannabis e explicou que a planta possui indicação com evidência científica para diversas doenças. “A aprovação da lei para o uso de Cannabis medicinal representa um avanço importante na saúde pública do Estado. Com essa lei, diversos pacientes irão se beneficiar por ter acesso a esse tratamento, principalmente, aqueles que são refratários a outras terapêuticas medicamentosas. Além disso, ela possui indicação para tratamento de diversas patologias, como a fibromialgia, por exemplo. É importante ressaltar que a lei também estimula as pesquisas científicas, o que contribui para o uso cada vez mais seguro da Cannabis medicinal”, salientou.

A também médica prescritora e reumatologista, Alejandra Debbo, explicou que a regulamentação da lei facilita o acesso dos pacientes aos medicamentos. “Fico muito feliz pela aprovação da lei em Sergipe, pois sabemos que os produtos que estão no mercado não são acessíveis para a população geral devido aos custos elevados e muitas vezes não conseguimos prescrever para todos os pacientes. Sabemos que o Cannabis vem sendo muito importante trazendo muitos benefícios no tratamento de várias doenças. Então, a regulamentação da Lei promove acessibilidade aos pacientes, facilitando a prescrição e o tratamento das pessoas”, disse.

Legislação

A discussão em torno da política pública da Cannabis vem sendo tratada há algum tempo dentro das instituições. É o que atesta a advogada e presidente da Comissão de Direito Médico e Saúde da OAB/SE, Carolina Teixeira. Segundo a advogada, no ano passado Sergipe sediou o 1º Simpósio de Cannabis, onde diversos profissionais da saúde que são referência no país estiveram presentes para discutir a autonomia da prescrição médica no uso da Cannabis.

“Quando falamos de uma aprovação legislativa vemos um avanço imensurável para os usuários do Sistema Único de Saúde (SUS), pois a eficácia é baseada em evidências com inúmeros estudos que demonstram que a utilização terapêutica da cannabis traz benefícios para o paciente em si, assim como a judicialização no fornecimento dos fármacos da Cannabis que tem um custo alto. Então, quando uma lei como essa é aprovada, a política passa a ser incorporada ao tratamento pelo SUS e consequentemente acaba reduzindo custos de internamentos e principalmente dando assistência a população”, ressaltou Carolina.